quinta-feira, setembro 29

Mais do mesmo

Oliveira é seguramente uma das terras onde a competência mais se tem afastado do poder emergindo no inevitável circo politiqueiro local, as figuras mais inesperadas. Todos sabemos que gerir os destinos de uma autarquia sem um projecto estratégico, com tanta parcimónia e falta de ideias, os níveis de exigência para se apresentar uma potencial alternativa não serão muito elevados, mas é francamente constrangedor, a pobreza das novas propostas para tentar interpolar este marasmo habilmente iludido pelo actual edil que se tornou mestre na arte do nada.
Dir-me-ão que aqui não é muito diferente de outras autarquias, que a maioria dos autarcas não tem qualquer experiência para o cabal desempenho desse importante cargo e será mesmo inútil enfatizar que os concelhos do interior são ainda os mais necessitados de propostas realmente inovadoras, porque também são, para mal dos nossos pecados, os mais vulneráveis à cabotinagem política.
Ficam para já os lugares comuns, os out-doors, hoje mais acessíveis pelo crescimento das novas tecnologias, a vacuidade das mensagens, a vaidade dos protagonistas, mas acima de tudo a triste perspectiva de mais do mesmo.
Quando será que os eleitores serão capazes de ignorar as hábeis e insidiosas técnicas de imagem no momento das urnas? Hoje tais habilidades nalguns casos indecorosas e risíveis, ainda elegem autarcas, mas tenho muita esperança que o futuro tudo mude e que por exemplo, o auto elogio dos proponentes se torne a mais grotescas das estratégias.
Nessa altura serão os eleitores a classificar os autarcas de competentes! Por ora basta que eles se afirmem como tal.
Para os que dizem por aí que não votam por falta de alternativas, poderá ser essa, a atitude mais inteligente. Sou dos que advogam que não votar também é intervir, mas sobretudo exprimir uma vontade. E já pensava assim muito antes do nosso prémio Nobel.

terça-feira, setembro 20

Coragem para mudar

Há uns tempos atrás, os mais atentos recordar-se-ão, a audácia ficou mais longe do poder, quando teve o atrevimento de usar um insulto à boa maneira do PREC. Linguagem abusiva e desajustada aos nossos tempos que acabou por eleger a ponderação como o critério mais natural para o perfil do melhor candidato.
O sorriso é hoje a doce imagem da mudança.
É de facto preciso muita coragem para mudar, mesmo quando essa mensagem está acompanhada de um belo sorriso. É que mesmo ao lado repetem-se em grandes dimensões auto-elogios capazes de fazer morrer de inveja o mais mediático dos candidatos. Competência, honestidade, trabalho... Valores inquestionáveis, e expostos assim, em grande formato, relidos todos os dias enquanto contornamos as rotundas ou esperamos o verde dos semáforos, só por manifesta má vontade não acreditamos. É aquela velha ideia de que uma mensagem várias vezes repetida se torna uma verdade absoluta.
Corro o risco de ser mal entendido mas não consigo evitar o pensamento que o avanço feminino, como alternativa no apelo do poder, faz todo o sentido num concelho como este, onde as grandes ideias se resumem ao adorno. Não hesito nem um segundo em admitir que qualquer mulher saberá muito melhor prosseguir esse grande desígnio autárquico.

segunda-feira, setembro 19

Novamente o boletim e a saudade do Outono

( escrito em 19/09/2004 )
Prefiro os dias outonais, em que as folhas rodopiam em círculos por entre as estátuas e os bancos dos jardins, ao vazio quente dos tristes dias estivais de Oliveira do Hospital.
Uma terra onde resistem ao descuido, sinais de identidade e história que nos conduzem à nostalgia. Indeléveis sinais de outra cidade, de outros tempos, com outros protagonistas.
Prefiro o Outono em Oliveira, pela sensação do regresso ao escuro, que a meu ver a favorece e lhe confere a sua verdadeira essência. O cheiro a chuva, a escuridão prematura, os silêncios, a evocação do antigo, o convite à poesia, tudo me ajuda a esquecer o marasmo a que votaram esta terra.
Sinais destes tempos, em que as grandes ideias autárquicas se resumem a um jardim, uma praia fluvial, um calcetamento, uma fonte. Oliveira desliza numa letargia enfeitada com flores, uma passividade extrema, sem acontecimentos nem expectativas, mas exemplar no adorno e na requalificação dos espaços.
Requalificar, reconstruir, repensar... O tal prefixo que pressupõe repetição e no contexto das minhas reflexões disfarça a incapacidade de fazer novo, construir ou mesmo pensar.
O problema nem é tanto a ideia do refazer melhorando, como é bom exemplo o esforço em repor a dignidade perdida a espaços tão belos como Avô. Grave é não fazer, triste é a sensação desconfortante de ver um concelho deambular num deserto de ideias, entregue a um destino incerto, sem a expectativa de nada de novo. Particularmente quando assistimos bem perto, por um lado à enorme vitalidade na criação de novos espaços que proporcionam eventos, por outro mesmo, a capacidade de os realizar: Feiras Internacionais, concertos sinfónicos, torneios desportivos internacionais, teatro de qualidade e dimensão nacional, exposições dignas desse nome, certames que resistem às dificuldades da conjuntura, etc...
São os espaços que proporcionam os eventos e nunca o contrário. Mas para isso é preciso criá-los e isso talvez seja pedir muito a uma gestão autárquica tão parcimoniosa.
Enfim, a inércia, quando dela se tem consciência, pode muito bem tornar-se uma inteligente estratégia da incompetência. De facto quando nos habituamos a não esperar muito, qualquer irrelevância se torna, pelo inesperado, uma grande obra.
Talvez isso explique tudo ou então socorrendo-me de Eduardo Prado Coelho quando evoca Duras, e fala acerca do seu fascínio pela passividade extrema e pelas personagens que não agem e se deixam expor na pura exaltação de existirem. Na mitologia da escritora, escreve Prado Coelho, seres assim têm na passividade uma força imensa, sendo mais enérgicos pelo que não fazem do que pelo que poderiam fazer.
Talvez resida aí o segredo de toda esta submissão silenciosa ao que se passa, ou melhor, ao que não se passa em Oliveira do Hospital.