domingo, fevereiro 5

A Valsa das gramíneas

Olho em baixo o centeio bailando ao som do vento. Pareceu-me uma valsa. Lento, alegreto, alegro, num compasso de três por quatro, o centeio valsava naquele espantoso lugar onde o tempo vive à parte, muito lentamente.
Na elegância desse convite à valsa, insinuante e provocador, aquela visão das bailantes gramíneas trouxe-me um corpo de mulher visto na sua nudez. A mesma macieza, o mesmo desabrigo convidando a carícia e por momentos apelando à precipitação naquele vale profundo e conciliador das cordilheiras.
Subi e desci, ora em baixo ora em cima, suspenso de quando em vez na contemplação dos planaltos até o arrebatamento final, no assomo de novos horizontes.
E foi aí que fiquei, na saciedade do depois, na sensação indizível do fim que não termina, que se prolonga para além do prazer, infindável como a linha do horizonte.

Joaquim Nobre