terça-feira, setembro 21

O Ensaio do autarca


A única mesa não preparada foi curiosamente a escolhida pelo homem que acabava de entrar no restaurante. Pelo porte, pela voz altiva, pelos gestos de veneração dos presentes tratava-se certamente de alguém muito importante nesta terra que o meu amigo António visitava pela primeira vez.
Perante o olhar perplexo do meu convidado, o presumível notável, ele próprio, com as suas próprias mãos, pôs a mesa. Um gesto de grande humildade que não deixou ninguém indiferente.
Revelei ao António a verdadeira identidade da personagem. O seu sorriso desdenhoso revelava ser profundo conhecedor da essência das atitudes dos políticos, habilidosos no culto da personalidade conveniente.
Entendeu rapidamente o motivo da escolha daquela mesa. Tornou-se por momentos num excelente elemento cenográfico. Aquela demonstração de humildade não era mais do que um ensaio na arte do fingimento, um entre muitos outros que se seguiriam para recolocar uma peça em cena.
A cerca de um ano da estreia os ensaios tinham começado.

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